segunda-feira, 7 de janeiro de 2013
domingo, 6 de janeiro de 2013
Mais uma de...
Havia uma comunidade muito
carente, chamada Cantagalo. Neste local, tudo era muito precário. As ruas não
eram pavimentadas, não havia tratamento de esgoto, água encanada, tampouco,
iluminação pública. Na verdade, os moradores sequer tinham documentos de propriedade
dos seus imóveis, tendo em vista que esta comunidade fora resultado de uma
invasão de terras realizada após seus moradores serem despejados de uma favela
que deu lugar a um shopping.
Nela
havia um morador que todos o chamavam de seu Mane, um senhor de meia idade,
muito trabalhador e honesto, que, nas horas vagas, lutava para melhorar a vida
de todos os moradores da comunidade. Tapava os buracos causados pelas chuvas,
ajudava a construir barracos para os novos moradores, conseguia cestas básicas aos
mais necessitados, organizava mutirões de limpeza para manter a comunidade
limpa. Além de tudo isso, ele ainda vivia levando os moradores doentes ao
Pronto Socorro. Enfim, seu Mane era como diziam: “Pau para toda obra”.
Por
ajudar muito a comunidade ele era muito admirado e respeitado, era considerado
o “pai” de todos. Todos os moradores lhe amavam. Pois sabiam que, quando
precisassem podiam contar com ele.
Um
dia, alguns moradores vieram à sua porta e fizeram-lhe uma proposta.
-
Nem pensar. – respondeu – Não gosto e não quero me envolver com política. Sinto
muito. Eu sei que Cantagalo precisa, e muito, de um representante, mas, eu não
posso ser, sinto muito amigos, sinto muito mesmo, mas, dessa vez, não poderei
ajudá-los.
-
Pense bem, seu Mane, precisamos de uma pessoa para nos representar, precisamos
de alguém para legalizar a nossa situação aqui e só o senhor é capaz disso.
-
O Senhor sabe muito bem, das nossas necessidades, vamos lá, nos ajude se
candidate. Todos nós precisamos, e muito, do Senhor. – disse outro morador.
-
Não dá... – respondeu.
-
Claro que dá. – disse outro morador – O Senhor tem os votos de todos os
moradores da comunidade. Sem contar que é a pessoa mais preparada para nos
representar.
-
Isso mesmo – disse outro – Por favor, o senhor não pode nos deixar na mão. Não
agora que podemos transformar este lugar. Por favor, seu Mane.
Mane
não teve como dizer não, por isso, se candidatou e foi eleito.
Após
assumir sua vaga na prefeitura, Mane pôs-se a trabalhar pela comunidade, transformando-a.
Luz elétrica, água encanada, pavimentação, a comunidade transformou-se em um
lugar melhor e seu Mane foi o responsável por toda essa transformação. Mané
começou a ser reconhecido em toda a cidade. Aos poucos sua popularidade foi
aumentando, apareceu em várias redes de televisão e rádios, sempre levando
consigo o nome da comunidade. Com o aumento de sua popularidade aumentou também
sua influência. Em pouco tempo Seu Mane transformou-se em rei. Tudo passava por
seu crivo. Na comunidade tudo tinha que ser autorizado por ele. Sua palavra era
ordem, ninguém ousava contrariá-lo. Mas, não era preciso, suas intenções sempre
foram as melhores. Mane sempre pensava na comunidade. Sempre pensava em seus filhos.
Como
boa pessoa que era seu Mané, não só ajudou a sua comunidade, mas todas as
comunidades carentes próximas. Na sua segunda eleição foi recordista em votos.
No entanto logo depois de reeleito, suas atitudes começaram a mudar. Sua
presença na comunidade foi diminuindo, diminuindo. Até que ele desapareceu.
Sumiu. Com o desaparecimento de Mane, os projetos sociais também foram
desaparecendo, escasseando.
Preocupados
com a situação, os moradores foram inúmeras vezes à câmara de vereadores a fim
de falar com ele, mas, em vão. Nunca foram atendidos. Seu Mane, sempre estava
em alguma reunião interminável.
Candidato
a deputado ganhou a eleição. Nesta época não morava mais em Cantagalo, a
comunidade, também, já não foi a responsável pela sua eleição. Agora, seu Mané,
morava em um bairro nobre da cidade, andava de carro importado, seus filhos,
estudavam em escolas particulares, ele, não tinha mais nenhuma ligação com o
povo que o elegeu. Continuava sendo o Seu Mane, mas, não da comunidade que o
elegeu, e sim do partido que o elegeu. Mudou-se para Brasília, para ficar mais
próximo do trabalho. Enriqueceu. Comprou fazendas e jatos. Nunca mais voltou
para a periferia de onde saiu.
Anos
depois, foi acusado de desviar o dinheiro que iria para a merenda escolar de um
estado, mas, foi absolvido, por falta de provas. Foi reeleito, reeleito... E,
novamente acusado de desvio de verbas. Como na vez anterior, foi absolvido
pelos seus.
Na
comunidade em que vivia os mais velhos, dizem que ele foi obrigado a abandonar
o local, e que, por ingenuidade esta sendo usado por pessoas mais espertas, que
tiram proveito dele.
Mas
a maioria, diz que ele na verdade, não passa de mais um filho da p... .
Marc Souz
sábado, 5 de janeiro de 2013
Tragédia Anunciada
Estavam eles correndo
pelas vielas da favela. Pequenas passagens de terra batida, entre barracos de
madeira, papelão, latas ou quaisquer outros objetos que pudessem ser utilizados
para a construção. Dois meninos. Duas crianças correndo. Correndo com armas em
punho.
De repente, são
surpreendidos por dois policiais que sobem pela favela. Nervosos. Ansiosos.
Preocupados. Afinal, o terreno é hostil. Apesar de estarem ali para protegerem
a comunidade do tráfico local, que impõe regras violentas aos que não se
sujeitam a eles. São vistos com desconfiança pelos pobres moradores, que na
maioria das vezes preferem ajudar o tráfico. Por medo. Desespero. Por falta de
fé. Falta de fé nas leis. Na justiça. Por falta de fé na policia que, tão logo
se vai, e os bandidos voltam a dominar e a trazer o terror aos pobres
moradores.
Os meninos passam
correndo pelos policiais sem aos menos perceber a presença deles. Correm feitos
loucos. Atrás não se sabe do que. Não se sabe de quem. Somente correm, segurando
suas armas.
Os policiais, ao verem os
meninos, saem atrás.
Meu Deus! - pensa um dos
policiais – São crianças. Pequenas criaturas. Pequenos anjos, com armas em
punho. Meu Deus! Meu Deus! Hesita. Por um momento, não sabe o que fazer. Não
sabe se deve cumprir seu dever, ou se deve ignorar a situação. Afinal são
crianças. Inocentes, aliciados pela maldade humana. Inocentes, miseráveis
lutando para viver a seu modo. Do jeito que a vida lhes impõe. Do jeito que
Deus quer. Ou, a vida quer. E se eles atirarem? Terei coragem de revidar? - sua
cabeça não para de pensar um só minuto – Terei coragem de atirar contra essas
pequenas criaturas? A situação é tensa. A ansiedade e o medo aumentam
gradativamente. Será uma armadilha? Será que estão em um caminho sem volta?
Mas... Mas... São só crianças... Talvez, talvez só estejam... Deixa pra lá... –
ele procura abandonar os pensamentos que o assombram continuando a perseguir as
pobres criaturas, por entre as vielas.
Os meninos correm sem se
darem conta de que estão sendo perseguidos pelos policiais. Pulam os buracos
cheios de esgoto, de sujeira, de restos de comida e lixo. Naquela terra onde os
estado se esqueceu, correm, correm, correm sem se darem conta do que realmente
esta acontecendo. Correm em busca do nada. Em busca de tudo. Ou simplesmente
correm para esquecer a penúria, a miséria em que vivem. Correm se olhar para
trás.
De repente chegam a um
beco sem saída. Um dos meninos aponta a arma para o outro, que, sem ter para
onde correr, vira-se e levanta a mão. Os policiais param a certa distância, não
acreditam no que vêem.
Meu Deus! O que esta
acontecendo? Eles... Eles vão se matar.
Então antes que a
tragédia anunciada se concretizasse, ele grita:
- Não faça isso! Ou eu...
– Ele não sabe o que fazer. Não sabe se, tem coragem de puxar aquele gatilho.
Só sabe que tem que fazer algo. Procura demonstrar frieza. Coragem, no entanto
não tem certeza que esta sendo convincente. Olha para o seu parceiro, e vê o
horror em seus olhos. Vê-o suando em bicas. Sofrendo com aquela situação
incomum. Anos de trabalho, vivendo em situações limites. Sendo testemunhas das
mais absurdas e cruéis situações. Naquele momento não sabem o que fazer. O medo
é palpável. A insegurança, real. Se fosse possível, virariam as costas e iriam
embora, sem olhar para trás. Mas não havia escolhas. – Joguem as armas no chão
– continuou.
Os meninos, ao verem as
figuras dos policiais logo atrás deles, apontando-lhes as armas, entraram em
choque. Jogando as armas no chão, se abraçam e se encolheram chorando.
Desesperados. Amedrontados.
- Por favor, não nos
matem- grita um deles – nós não estamos... – O policial se abaixa e pega as
armas –... Nós não estamos fazendo nada... – armas de brinquedo – Só estamos
brincando. Só brincando.
Naquele momento os
policiais sorriram. Como nunca. Como nunca.
Marc Souz
sexta-feira, 4 de janeiro de 2013
Assinar:
Postagens (Atom)